terça-feira, 28 de agosto de 2012

A AVAREZA - DO LIVRO: "OS SETE PECADOS CAPITAIS"(2010)-FERNANDO MARTINS FERREIRA

A Avareza “O avarento é o mais leal depositário dos bens de seus herdeiros” Marquês de Marica A avareza simboliza o desejo desordenado pelos bens terrestres. Segundo o conceito cristão, o homem se preocupa em acumular bens que não consegue levar para o céu e que conduz à idolatria, por tratar algo como se fosse de Deus. E a cobiça dos bens materiais e dinheiro entende-se como a ambição por riquezas. É também o desejo veemente, intenso e violento de possuir algo. O avaro tem apego excessivo a alguma coisa levado pelo grande medo de faltar, é sinônimo de ganância ou seja, vontade exagerada de posse. Para o avaro, os bens materiais deixam se ser um meio para aquisição de bens e serviços para a satisfação de necessidades, mas um fim em si. No conceito popular é o muquirana, o pão duro, o sovina, o unha de fome, o mão de vaca, o Nhônhô Correia (personagem de uma novela da TV Globo). O personagem Tio Patinhas da Disney, personifica o quadro, se lembra dele? O “avarento” renega aos próprios desejos e necessidades para apenas ter uma possibilidade de gozar de fato, de poder assim possuir um pouco mais de dinheiro em sua conta bancária. Não liga a mínima para valores imateriais como cultura, arte, amor, inteligência, beleza, pois são elementos abstratos e não podem ser transformados em dinheiro. Não sabem apreciar, mas às vezes usam desses valores para se enriquecer um pouco mais. Veja o exemplo a seguir: Conta-se que nos alpes italianos existia um pequeno vilarejo que se dedicava à cultura de uvas para a produção de vinho. Uma vez por ano acontecia uma grande festa para comemorar o sucesso da colheita e se fazer novos negócios. Para lá se dirigiam comerciantes e exportadores de vinho da região. A tradição exigia que nesta festa cada morador do vilarejo trouxesse um garrafão do seu melhor vinho para colocar dentro de um grande barril que ficava na praça central. Assim todos se serviam do vinho, festejavam e faziam grandes negócios. Porém, um dos moradores pensou: “Por que deverei levar um garrafão do meu melhor vinho? Levarei água pois no meio de tanto vinho bom o meu não fará falta. Guardarei o meu e o venderei por um bom preço e assim aumentarei um pouco mais a minha fortuna”. Assim pensou e assim fez o avarento produtor. Conforme o costume, em determinado momento, todos se reuniram na praça, cada um com sua caneca, para provar aquele vinho, cuja fama se estendia muito além da fronteira do país. Contudo, ao abrir a torneira um absoluto silêncio tomou conta da multidão. Do barril saiu ... água! A ausência de minha parte não fará falta foi o pensamento de cada um dos produtores. O escritor Ralph Waldo Emerson, em “A conduta para vida”, diz sabiamente: - “Há homens nascidos para possuir e que sabem vivificar tudo que possuem. Outros não o sabem; a sua riqueza falta graça, parece um compromisso firmado com o seu caráter. Dir-se-ia que roubam os próprios dividendos. Deveriam possuir aqueles que sabem administrar, não os que acumulam e dissimulam, não aqueles que quanto mais possuem, mais mendicantes se mostram, porém aqueles cuja atividade da trabalho a maior número, abre caminho para todos”. Segundo São Tomás de Aquino, o grande filósofo cristão, a avareza possui sete filhos: a traição, a fraude, a mentira, o perjúrio, a inquietude, a violência e a dureza do coração. Segundo ele a avareza comporta atitudes, uma das quais é o excesso de apego ao que se tem, do qual procede a dureza do coração, o ser desumano que se opõe à misericórdia, porque evidentemente o avaro endurece o seu coração e não se vale de seu bens para socorrer misericordiosamente o próximo. Inquietude: na ânsia de amealhar bens, o homem se torna preocupado, desconfiado e inquieto. Violência: Pois na ânsia de amealhar bens alheios ele pode servir-se da força ou violência. E se ele engana alguém para lucrar, seria mentira e se essas palavras enganosas forem acompanhadas de juramento será perjúrio. Por amor ao dinheiro muitos praticam a mentira, a fraude. Quantos quilos que só possuem 900 gramas, quantos litros que só tem 980 ml, quantos produtos falsificados (combustível, entre tantos). Quanta trapaça, quanta enganação em nome da avareza. Todo avarento é pobre, vive sentado sobre o seu dinheiro, não gasta nada, passa até privações, não oferece nada a ninguém e guarda seus bens com a ferocidade de um animal selvagem. Ele com certeza é um infeliz pois vive eternamente em guarda, com medo de perder o seu rico dinheirinho ou outro bem que possui. Desconfia de tudo e de todos, achando que as pessoas se aproximam dele somente com a finalidade de extorquir-lhe algo. Não existe a avareza somente com bens e dinheiro, existem os avaros de carinho, de solidariedade, o avaro de amor, pois o avaro não conjuga e até mesmo odeia o verbo dar. O pecado da avareza não é uma prerrogativa dos ricos e endinheirados. Existem também os muitos pobres, avarentos de coração, secos, incapazes de um beijo, de um afago, muito menos de uma lágrima, pois esses gestos transmitem amor, e eles não sabem e têm medo de se doar. Pessoas que dão excessivo valor aos bens materiais precisam acreditar que são superiores para compensar um profundo complexo de inferioridade e crença na falta de sentido em que vivem. Para Carlos Heitor a avareza é: “O excesso de amor aos bens materiais. Nos dias atuais o neoliberalismo é avaro quando prega o lucro acima de tudo. É a avareza em estado exacerbado”.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

"A PREGUIÇA" DO LIVRO "OS SETE PECADOS CAPITAIS" (2010)-FERNANDO MARTINS FERREIRA

A PREGUIÇA “A preguiça anda tão devagar que a miséria facilmente a alcança”. Benjamim Franklin A preguiça é definida como aversão ao trabalho, negligência, indolência, pachorra, moleza, morosidade e lentidão para fazer qualquer tarefa. O preguiçoso sente um aborrecimento natural pelo trabalho do dia-a-dia e tem um apego enorme ao descanso que o leva a imitir suas obrigações ou descuidá-las. O preguiçoso é na verdade uma pessoa que não gera expectativa e sempre desvia de qualquer culpa que possa recair sobre ele. É portanto, sempre liso, escorregadio, é aquela pessoa que deixa sempre suas tarefas, os seus afazeres, para depois. É adepto do desculpismo e justifica sua preguiça com desculpas esfarrapadas do tipo: – “Amanha eu faço” – passam-se os dias e ele é cobrado pelo que não fez e ele arranja mais desculpas. Existem outras: – “Não posso, estou sem tempo” – já reparou que o preguiçoso está sempre sem tempo? - “Não fiz porque não estou me sentindo bem”: Porque não procura um médico para se tratar? - “Durmo muito porque estou cansado”: Dorme dorme e nunca está descansado, sempre precisa dormir mais. - “Não fiz o relatório porque não deu tempo”: Não deu tempo porque empurrou a tarefa, porque é desorganizado e não administra o seu tempo. - “Nossa! Me esqueci completamente”: Esqueceu-se? Porque não anotou? - “Amanha farei essa arrumação”: Sempre amanhã, engana a si próprio. Note que o preguiçoso está sempre fazendo os outros esperar porque não se organiza e não tem respeito com as pessoas. Chega sempre atrasado aos compromissos sofrendo com isso admoestações diversas. Está sempre perdendo objetos, não sabe nunca onde deixou aquela chave, os óculos, um livro ou a carteira. Desorganizado que é, perde precioso tempo na busca dos objetos. Não é adepto do abriu-fechou, acendeu-apagou, sujou-limpou. Podemos dizer que a preguiça se subdivide em preguiça espiritual e preguiça corporal. A primeira é a falta de ânimo, de coragem para o cumprimento dos deveres religiosos na oração e o segundo é mesmo o desleixo de nossas obrigações corporais. Segundo o Budismo, a preguiça é um dos principais obstáculos ao despertar da nossa alma. Ela se manifesta de três maneiras: a) A preguiça do conforto, que nos faz permanecer sempre no mesmo lugar; b) A preguiça do coração quando nos sentimos desencorajados e desestimulados; c) A preguiça da amargura quando nada mais importa e já não somos parte deste mundo. Seja qual for a religião, a preguiça é algo que deve ser combatido e pode ter modificações psicológicas ou fisiológicas no indivíduo. Portanto, a pessoa acometida de preguiça necessita estudar as circunstancias em que se encontra e traçar objetivos de modo que seja conveniente para si e para os demais. O que pode causar a preguiça? - Frio: O corpo necessita de movimento para manter-se aquecido. - Noite mal dormida: O sono faz com que as pessoas tenham seus movimentos e raciocínios limitados. - Ambiente calmo: Estimulam a indisposição e dão sono. - Má alimentação: Não gera energia suficiente para o organismo e dá moleza e indisposição. - Acúmulo de serviço: Faz com que a pessoa adie suas responsabilidades. - Excesso de comida ou bebida: Provoca a moleza e o sono. E no que resulta a preguiça? - Em desânimo: A pessoa não tem atitude de mudar o comportamento - Em fracasso: A pessoa não tem vontade de realizar nada e se torna ultrapassado, não conseguindo “prosperar” na vida pessoal e profissional. - Em problemas de saúde: Quem não se movimenta tem mais chances de contrair doenças. - Em necessidades: Aquele que não trabalha necessita de outros para manter suas atividades. A preguiça no entanto, pode ser contornada se o indivíduo procurar ter uma vida mais saudável de modo a melhorar sua indisposição através de uma alimentação adequada. É recomendável também a mudança de hábitos trocando-os por outros que lhe tragam maior satisfação além de organizar melhor o seu tempo, o espaço onde vive e a vida. Enfim, procurar coisas que dê satisfações e mais sentido à vida. O escritor espiritualista Divaldo Franco em seu livro “Conflitos Existenciais” recomenda contra a preguiça: a) Exercício, movimentação, afim de preservar a própria estrutura física, b) Exercitar a mente com pensamentos saudáveis, c) Pensar é uma benção. Auxilia a capacidade do raciocínio afim de elaborar projetos que mantenham o entusiasmo e a alegria de viver, d) Terapia para a preguiça, e) Interrogar-se por que estou sofrendo? Até quando suportarei essa situação? O despertar terapêutico, segundo Divaldo Franco, começa a surgir com a vergonha pelo estado que se encontra, dando início ao labor de renovação interna. Surge então, o natural desejo para a recuperação passando a ver a preguiça como enfadonha e monótona. Conta uma história da tradição oral que: Assim que morreu, José encontrou-se num belíssimo lugar rodeado de conforto e beleza. Um sujeito vestido de branco aproximou-se dele e disse: - “José, você tem o direito de pedir o que quiser: Qualquer alimento, prazer ou diversão”. Encantado, José aproveitou e fez tudo o que queria fazer durante a vida e não fez. Bebidas, mulheres lindas, festas intermináveis e jogos. A vida lhe sorria de domingo a domingo, mas acontece que até dos excessos de prazeres, o homem se cansa. E depois de muitos anos, procurou o sujeito de branco: - Já experimentei tudo o que tinha vontade, disse. - Preciso agora de um trabalho, o menor que seja, para me sentir útil. - Sinto muito – Disse o sujeito de branco – mas esta é a única coisa que não posso conseguir. Aqui não há trabalho. - Que isso? – gritou surpreso o José – Passar a eternidade morrendo de tédio? Está louco? Não quero. Prefiro mil vezes estar no inferno. O homem de branco aproximou-se e disse em voz baixa: - E onde o senhor pensa que está? Não devemos, no entanto, confundirmos repouso com preguiça. O repouso é necessário e é o momento em que se processa o importante trabalho do armazenamento da força vital dentro de nós.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

A PREGUIÇA - DO LIVRO ''OS SETE PECADOS CAPITAIS" DE FERNANDO MARTINS FERREIRA

“A preguiça anda tão devagar que a miséria facilmente a alcança”. Benjamim Franklin A preguiça é definida como aversão ao trabalho, negligência, indolência, pachorra, moleza, morosidade e lentidão para fazer qualquer tarefa. O preguiçoso sente um aborrecimento natural pelo trabalho do dia-a-dia e tem um apego enorme ao descanso que o leva a imitir suas obrigações ou descuidá-las. O preguiçoso é na verdade uma pessoa que não gera expectativa e sempre desvia de qualquer culpa que possa recair sobre ele. É portanto, sempre liso, escorregadio, é aquela pessoa que deixa sempre suas tarefas, os seus afazeres, para depois. É adepto do desculpismo e justifica sua preguiça com desculpas esfarrapadas do tipo: – “Amanha eu faço” – passam-se os dias e ele é cobrado pelo que não fez e ele arranja mais desculpas. Existem outras: – “Não posso, estou sem tempo” – já reparou que o preguiçoso está sempre sem tempo? - “Não fiz porque não estou me sentindo bem”: Porque não procura um médico para se tratar? - “Durmo muito porque estou cansado”: Dorme dorme e nunca está descansado, sempre precisa dormir mais. - “Não fiz o relatório porque não deu tempo”: Não deu tempo porque empurrou a tarefa, porque é desorganizado e não administra o seu tempo. - “Nossa! Me esqueci completamente”: Esqueceu-se? Porque não anotou? - “Amanha farei essa arrumação”: Sempre amanhã, engana a si próprio. Note que o preguiçoso está sempre fazendo os outros esperar porque não se organiza e não tem respeito com as pessoas. Chega sempre atrasado aos compromissos sofrendo com isso admoestações diversas. Está sempre perdendo objetos, não sabe nunca onde deixou aquela chave, os óculos, um livro ou a carteira. Desorganizado que é, perde precioso tempo na busca dos objetos. Não é adepto do abriu-fechou, acendeu-apagou, sujou-limpou. Podemos dizer que a preguiça se subdivide em preguiça espiritual e preguiça corporal. A primeira é a falta de ânimo, de coragem para o cumprimento dos deveres religiosos na oração e o segundo é mesmo o desleixo de nossas obrigações corporais. Segundo o Budismo, a preguiça é um dos principais obstáculos ao despertar da nossa alma. Ela se manifesta de três maneiras: a) A preguiça do conforto, que nos faz permanecer sempre no mesmo lugar; b) A preguiça do coração quando nos sentimos desencorajados e desestimulados; c) A preguiça da amargura quando nada mais importa e já não somos parte deste mundo. Seja qual for a religião, a preguiça é algo que deve ser combatido e pode ter modificações psicológicas ou fisiológicas no indivíduo. Portanto, a pessoa acometida de preguiça necessita estudar as circunstancias em que se encontra e traçar objetivos de modo que seja conveniente para si e para os demais. O que pode causar a preguiça? - Frio: O corpo necessita de movimento para manter-se aquecido. - Noite mal dormida: O sono faz com que as pessoas tenham seus movimentos e raciocínios limitados. - Ambiente calmo: Estimulam a indisposição e dão sono. - Má alimentação: Não gera energia suficiente para o organismo e dá moleza e indisposição. - Acúmulo de serviço: Faz com que a pessoa adie suas responsabilidades. - Excesso de comida ou bebida: Provoca a moleza e o sono. E no que resulta a preguiça? - Em desânimo: A pessoa não tem atitude de mudar o comportamento - Em fracasso: A pessoa não tem vontade de realizar nada e se torna ultrapassado, não conseguindo “prosperar” na vida pessoal e profissional. - Em problemas de saúde: Quem não se movimenta tem mais chances de contrair doenças. - Em necessidades: Aquele que não trabalha necessita de outros para manter suas atividades. A preguiça no entanto, pode ser contornada se o indivíduo procurar ter uma vida mais saudável de modo a melhorar sua indisposição através de uma alimentação adequada. É recomendável também a mudança de hábitos trocando-os por outros que lhe tragam maior satisfação além de organizar melhor o seu tempo, o espaço onde vive e a vida. Enfim, procurar coisas que dê satisfações e mais sentido à vida. O escritor espiritualista Divaldo Franco em seu livro “Conflitos Existenciais” recomenda contra a preguiça: a) Exercício, movimentação, afim de preservar a própria estrutura física, b) Exercitar a mente com pensamentos saudáveis, c) Pensar é uma benção. Auxilia a capacidade do raciocínio afim de elaborar projetos que mantenham o entusiasmo e a alegria de viver, d) Terapia para a preguiça, e) Interrogar-se por que estou sofrendo? Até quando suportarei essa situação? O despertar terapêutico, segundo Divaldo Franco, começa a surgir com a vergonha pelo estado que se encontra, dando início ao labor de renovação interna. Surge então, o natural desejo para a recuperação passando a ver a preguiça como enfadonha e monótona. Conta uma história da tradição oral que: Assim que morreu, José encontrou-se num belíssimo lugar rodeado de conforto e beleza. Um sujeito vestido de branco aproximou-se dele e disse: - “José, você tem o direito de pedir o que quiser: Qualquer alimento, prazer ou diversão”. Encantado, José aproveitou e fez tudo o que queria fazer durante a vida e não fez. Bebidas, mulheres lindas, festas intermináveis e jogos. A vida lhe sorria de domingo a domingo, mas acontece que até dos excessos de prazeres, o homem se cansa. E depois de muitos anos, procurou o sujeito de branco: - Já experimentei tudo o que tinha vontade, disse. - Preciso agora de um trabalho, o menor que seja, para me sentir útil. - Sinto muito – Disse o sujeito de branco – mas esta é a única coisa que não posso conseguir. Aqui não há trabalho. - Que isso? – gritou surpreso o José – Passar a eternidade morrendo de tédio? Está louco? Não quero. Prefiro mil vezes estar no inferno. O homem de branco aproximou-se e disse em voz baixa: - E onde o senhor pensa que está? Não devemos, no entanto, confundirmos repouso com preguiça. O repouso é necessário e é o momento em que se processa o importante trabalho do armazenamento da força vital dentro de nós.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

VAI SAIR HOJE? TEXTO DO ESCRITOR FLAVIO MARCUS DA SILVA

Vai sair hoje? O ano era 1987. O local, o pátio de um colégio cinzento, onde adolescentes jogavam bola,conversavam ou ficavam parados, em silêncio, ao redor das quadras de vôlei, peteca efutebol, esperando terminar o horário da Educação Física. O tempo não passava naquelecolégio. Cada aula parecia durar uma eternidade, e quando o último sinal tocava, eu ia embora, feliz da vida, pensando: “Agora eu vou fazer o que eu gosto”. Mas no pátio daquele colégio triste, numa manhã de quinta-feira do ano de 1987, uma adolescente baixinha perguntou à sua colega: “Você vai no BEB&RANGO no final de semana?” E a outra respondeu: “Acho que vou”. As duas tinham doze anos e já “saíam”. Sair. Este era o verbo mais chique daquele pátio, pois significava “Eu aproveito a vida, sou importante, faço parte da sociedade”: “Eu saio”. E no BEB&RANGO, ao final da tarde(não sei se de sábado ou de domingo), aquelas meninas ficavam andando pra lá e pra cá, de narizes empinados, rindo e conversando com os garotos mais velhos, de 16, 17 ou 18 anos, se achando o máximo dos máximos. Aos 12 anos eu não saía. Nem aos 13. Nem aos 14. Até o início da década de 90 eu praticamente não existia para o mundo exterior, somente para a minha família, que às vezes se preocupava com o fato de eu ser tão introspectivo, tão mergulhado em meu mundo interior: este sim maravilhosamente turbulento e confuso, cheio de cores, ao contrário do universo desbotado e distante daquele colégio e daquele bar tão popular em Pará de Minas na segunda metade da década de 80. Não sair significava não existir, não viver. “Você não sai, não aproveita a vida”, costumavam dizer. Eu ouvia isso, mas não entendia, porque eu vivia e aproveitava a vida intensamente, do meu jeito. Meu maior prazer, quando eu me via livre daquelas aulas insuportáveis, era a leitura. Eu praticamente lia um livro por tarde, deitado no grande sofá da sala de visitas da minha casa, sem ninguém para me incomodar. Eu me desligava do mundo exterior e mergulhava nas histórias com um prazer imenso, avassalador. Eu sentia minha alma pulsar, agradecendo aquelas palavras e frases que me conduziam por cenários incríveis, em histórias emocionantes, contadas por mestres como Marcos Rey, Lúcia Machado de Almeida, Stella Carr, Júlio Verne e Agatha Christie. E no início dos anos 90, quando eu descobri autores como Rubem Fonseca e Edgar Allan Poe, e me recusava a trocá-los por uma saída no Geraldinho sábado à noite, a pressão paraeu sair aumentou, porque eu TINHA que beber, TINHA que ficar com as meninas e provar um monte de coisas para um monte de gente. E eu saía. E era como voltar àquele colégio e ter que assistir sem vontade àquelas aulas inúteis de Danças e Teatros, Educação Moral e Cívica, História e Português. Cheguei até a ficar com algumas meninas, mas quando isso é feito apenas para cumprir uma obrigação social, é ruim, não dá prazer. Isso acontecia no antigo Bar do Geraldinho, na rua Coronel Domingos, onde a juventude se encontrava pra ficar parada na rua e nos passeios bebendo em pé e vendo os carros passarem cantando pneu e fazendo fumaça com o som no talo: mais ou menos o que acontece hoje no Stop & Shop na sexta à noite. Quando eu sentia que minha obrigação tinha sido cumprida, eu saía de fininho, e ainda aproveitava um restinho da noite em casa, assistindo a alguns programas e filmes da madrugada. Com relação a isso, minhas angústias só terminaram em 1992, quando eu comecei a namorar uma menina mais velha, na CEDAF, em Florestal, onde a gente estudava (eu tinha 16 e ela 26), e ela me apresentou à obra do escritor anarquista Roberto Freire, que mudou a minha vida: Cleo e Daniel, Ame e dê vexame, Sem tesão não há solução e Coiote, livros que me mostraram a beleza de ser aquilo que você realmente é, de corpo e alma, sem se preocupar com o que os outros pensam de você. Em 92 e 93 participei de palestras e oficinas do grupo SOMA, fundado pelo próprio Roberto Freire, e aprendi a me conhecer melhor e a valorizar mais minha originalidade única, ligada ao meu prazer de ser e estar no mundo. Minha vida melhorou muito depois disso, mas hoje penso que a utopia anarquista de uma sociedade totalmente livre de qualquer forma de poder e opressão é um sonho impossível. Somos escravos de uma série de convenções e regras sociais, que nos impedem muitas vezes de sentir o verdadeiro prazer de existir. Tais regras são tão implacáveis, que a gente acaba criando para nós uma felicidade artificial, baseada em coisas efêmeras, como “ter aquele carro”, “ter aquele notebook”, “ter aquele cargo”, “ter aquele apartamento”, “ter aquela aposentadoria”, “ter aquele corpo sarado”, “ter aquela mulher gostosa”, “ter aquela mulher rica”, etc., enquanto a nossa originalidade única, a nossa natureza e o nosso prazer (autêntico, verdadeiro) vão ficando em segundo plano, até desaparecerem quase por completo sob o peso da ideologia burguesa e de sua frase mais emblemática: “O importante não é fazer o que se gosta, mas gostar do que se faz”. Só que a gente raramente se dá conta de que esse último “gostar” da frase é, muitas vezes, uma criação artificial, que apaga o nosso ser verdadeiro, o nosso tesão de existir. Prefiro a frase do Caetano: “Um porto alegre é melhor que um porto seguro para essa nossa viagem no escuro”. QUEM É FLÁVIO MARCUS DA SILVA Nascido em Pará de Minas- MG em 1975. Possui graduação em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (1997) e doutorado pela Universidade federal de Minas Gerais (2002) com estágio (Doutorado- sanduíche/CAPES) na Universidade de Lisboa- Portugal (2002). Atualmente é Vice- diretor da Faculdade de Pará de Minas- FAPAM-(MG) onde já exerceu os cargos de Coordenador do Curso de História, coordenador do NUPE- Núcleo de Pesquisa, e foi professor nos cursos de História e Administração. Atualmente leciona nos cursos de Direito e Pedagogia. É autor do livro SUBSISTENCIA E PODER: a política do abastecimento alimentar nas Minas Setecentistas (Editora UFMG -2008) e de artigos publicados em periódicos e livros de História. Um de seus trabalhos foi publicado no livro HISTÓRIA DE MINAS GERAIS- As Minas Setecentistas (Editora Autentica 2007) obra vencedora do PREMIO JABUTI 2008 na categoria Ciências Humanas. Atualmente exerce também a função de Pesquisador Institucional da Faculdade de Pará de Minas junto ao Ministério da Educação, sendo responsável pelo acompanhamento dos processos e renovação de reconhecimento dos cursos de graduação da IES. Em 2009 foi eleito para a Academia de Letras de Pará de Minas. www.nwm.com.br/fms

terça-feira, 7 de agosto de 2012

A IRA - DO LIVRO: OS SETE PECADOS CAPITAIS(2010)-FERNANDO MARTINS FERREIRA

A Ira “A ira começa com o desatino e acaba com o arrependimento”. Hasdai Diz o dicionário que a ira é o intenso e descontrolado sentimento de raiva, ódio, zanga, indignação, desejo de vingança, paixão desenfreada que nos incita contra alguém ou algo. Esses sentimentos estão estritamente associados à desonra, brigas e desavenças de toda a espécie. É preciso distinguir entre ira e cólera, raiva e ódio. O ódio e a raiva de certa forma são a ira reprimida e são emoções destrutivas. A ira provoca maus pensamentos fazendo com que muitas vezes façam acusações injustas gerando com isso brigas e desavenças. Na verdade por baixo de toda a ira quase sempre detectamos medo. O medo de errar, de expressar, de perder espaço, enfim, ao invés de parar, pensar ou até mesmo temer, as pessoas atacam para se defender. Cada um de nós, se analisarmos com cuidado, já tivemos um tempo de ira e se pensarmos bem podemos cultivá-la dentro de nossa casa assistindo a filmes de extrema violência e crueldade, de heróis sanguinários que matam centenas de pessoas para vingar ofensas e injustiças. Nós e nossos filhos vamos dessa forma nos programando para reagir e as vezes somos levados ao arrebatamento que se traduz em berros e desaforos. Não se iluda, caro leitor, a inquietação é a variação do temor, do medo e ela também destrói a saúde física, a paz espiritual provocando conflitos. A Bíblia nos ensina: “Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre vossa ira” (Efésios, 4;26). Já em Provérbios 22, versículos 24 e 25 temos: “Não te associe-se com o iracundo, nem andes com o homem colérico, para que não aprendas as suas veredas e assim enlaces a tua alma”. Iracundo é aquela pessoa de cara amarrada, fechada que não esboça sequer um sorriso, que parece estar chupando limão dia e noite. É com certeza um ser azedo. Se dorme durante o dia, acorda mau humorado e com três pedras na mão e se não dorme, fica mau humorado por isso. Essas pessoas, sinceramente, me aborrecem e me cansam. Fazem como dizia Oduvaldo Viana Filho: “Do medo de viver um espetáculo de coragem”. Estão sempre em posição de combate vendo o mundo como adversário. Não olham para frente, vivem lutando contra quimeras, falta lhes o equilíbrio, bom senso e serenidade. A ira atenta contra os outros mas pode voltar-se, contra aquele que deixa o ódio plantar semente em seu coração. Existe o registro que em 1879, o professor Gates da Universidade de Harward nos Estados Unidos, apresentou os resultados de um experimento sobre os liquefeitos obtidos pela condensação do ar expelido pelos pulmões de um paciente. O seu experimento constituiu em introduzir um tubo de borracha na boca do paciente colocando a outra extremidade desse tubo dentro de um liquido químico que continha uma mistura de um iodeto com outra substância. O tubo de borracha foi resfriado de tal modo que o ar que saísse dos pulmões se condensasse ao passar por ele (o ar era mais quente) e pingasse dentro do líquido químico. Enquanto o paciente estava calmo e feliz, não houve nenhuma alteração no líquido químico, entretanto, quando foi provocada uma ira repentina no paciente, formou-se um precipitado de cor castanha dentro do recipiente com a mistura química. Dando sequência ao experimento, o professor Gates injetou o sumo obtido em pessoas e animais e constatou surpreso que eles ficavam excitados e nervosos. Comprovou assim que a ira produz substancias tóxicas ao organismo, as quais são expelidas até pela respiração e se essas toxinas passam pelos pulmões, é certo que causam danos a eles. Podemos comparar a toxina produzida pelo organismo humano nos momentos de ira ou de temor ao veneno que a cobra cascavel expele das presas quando ataca a vítima. Só que a cascavel possui uma bolsa para armazenar esse veneno, o qual é eliminado do organismo, enquanto no corpo humano não existem reservatórios desse tipo. Logo, no homem a toxina formada pela ira ou temor acaba circulando por todo organismo, prejudicando a si próprio. Veja o seguinte exemplo: Desde a infância Martim Luther King sofreu os rigores da discriminação racial. Seu filho Martim Luther King Jr. abraçou sua causa em favor dos direitos civis dos negros e foi assassinado em 1968. Um ano depois outro filho de King morreu afogado em uma piscina. Em 1974, novo golpe, sua esposa foi abatida por uma saraivada de tiros, disparado por um jovem enquanto tocava piano em pleno culto de sua igreja. Em 1984, perto de morrer aos 84 anos o velho King disse: - “Há dois homens que eu deveria odiar. Um deles é branco e o outro é negro, e os dois estão cumprindo pena por homicídio. Não odeio nenhum dos dois, não há tempo para isso, também não há razão. Nada pode rebaixar tanto um homem quanto ele se permitir decair a ponto de odiar alguém”. Como temos que exercitar a serenidade e o perdão! O interessante é que mesmo após 2000 anos da vinda do mestre dos mestres que nos ensinou a serenidade, o perdão e o amor incondicional não conseguimos fazer isso naturalmente. Porque ainda então sentimos que nossa raiva é desproporcional, a reação é desproporcional? Por que sentimos às vezes tão sensíveis a hostilidade humana a ponto de qualquer sinal da pessoa com a qual estamos interagindo ficamos alerta de sobre aviso como uma fera? Às vezes basta um olhar ou o tom de voz, um gesto para que reajamos e nos tornemos agressivos, para que a ira se manifeste. Nos sentimos agressivos, temos enorme dificuldade em perdoar o agressor. A única maneira de invertermos essa poderosa força negativa é com certeza buscarmos desenvolver virtudes de temperança e paciência.